ESCRITA AFETIVA

Sobre cachorras e sonecas

Observar minhas cachorras dormindo me traz uma paz automática, do tipo que não exige que eu me coloque conscientemente em um estado de calma para me livrar do estresse, simplesmente acontece.

Tenho duas Shih Tzu, Pepa e Nina, que depois de 10 anos de vida, ainda dormem como quando eram filhotes, ás vezes em posições engraçadas que me fazem pensar que resultariam uma bela dor nas costas se elas fossem humanas.

Quando meu marido e eu decidimos ter cachorro em casa, nós tínhamos uma premissa em mente: que fossem duas. Na época, nós morávamos em uma kitnet no centro de São Paulo e a gente sabia que um cachorro só iria se sentir solitário no apartamento durante o dia enquanto nós dois  estávamos no trabalho. 

Então, pegamos duas, irmãs, da mesma ninhada.

E como um bom casal que estava começando a aumentar a família pelos animais de estimação, nos tornamos pais de cachorro. E como bons pais de cachorro, gastávamos quase todo o nosso salário com petiscos, brinquedinhos, acessórios para alimentação, tapetinhos e caminhas, dentre outros cacarecos.

Quanto a hora do sono, elas tiveram coisas das mais variadas. Tapetinhos com desenhos temáticos, maleta de transporte toda almofadada por dentro e por fora que deveria servir como casinha também e camas para cachorro, propriamente ditas.

O mais interessante é que elas nunca se importaram com nada disso.

Os tapetinhos acabavam virando banheiro e porta-vômitos com o tempo, as maletas de transporte foram o símbolo mais volumoso de dinheiro desperdiçado que já tivemos, e as camas nunca eram usadas para dormir, apenas para o mesmo propósito dos tapetinhos.

E isso me faz lembrar que, quando nós pegamos nossas cachorrinhas, minha sogra, que também era mãe de cachorro, nos garantiu que os cachorros não costumam fazer suas necessidades perto de onde dormem. Me faz rir até hoje a audácia das nossas cachorrinhas em contrariar os costumes da própria espécie, considerando que minha sogra estivesse certa quanto a isso, claro.

Nossas peludinhas sempre gostaram de dormir no sofá, na nossa cama, em cima dos nossos sapatos ou das roupas que acabavam ficando pelo chão no final do dia. Mas o lugar favorito para dormir, sem dúvida sempre foi onde estivesse atrapalhando mais. Até hoje, se eu estiver dobrando as roupas na cama, elas querem deitar em cima das roupas. Se estivermos com a mala aberta no chão, nos preparando para uma viagem, elas escolhem tirar uma soneca ali, dentro da mala. Essa maneira delas de escolher locais para dormir criou uma piada interna entre meu marido e eu. Sempre que a gente flagra elas nesses lugares inusitados, dizemos que se não estiver atrapalhando o suficiente, não está bom o suficiente.

Agora, aqui no sofá, escrevendo esse texto e observando minhas cachorrinhas dormirem, uma no tapete da sala e a outra nos bichinhos de pelúcia das crianças, eu senti novamente essa paz automática e comecei a pensar sobre a simplicidade que sempre existiu nelas.

Elas nunca precisaram das coisas para uma boa soneca. Tapetinhos, acessórios, camas, nada disso tinha valor para elas. Seus lugares favoritos para cochilar sempre foram aqueles que estivessem mais perto de algum membro da família. E, caso não tivesse ninguém em casa, em contato com o cheiro de algum membro da nossa matilha.

Hoje, com a chegada das crianças, ainda me surpreendo ao ver as cachorras deitadas no travesseiro das meninas, nas roupas que elas deixaram pelo chão, nos brinquedos delas.

É lindo de se ver como elas receberam as irmãs mais velhas com carinho e com se sentem tão confortáveis em contato com o cheirinho delas quanto com o meu e do meu marido.

E é inspirador perceber que, assim como as cachorras, a gente não precisa de coisas para nos sentirmos bem, nos sentirmos seguros, nos sentirmos confortáveis o suficiente para fazer aquilo que nos coloca na posição mais vulnerável possível: dormir. Precisamos apenas estar, de alguma forma, perto de quem amamos e simplesmente satisfeitos com o fato de sermos quem somos, humanos.

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